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terça-feira, 14 de dezembro de 2010

DA SOLIDÃO

                 As pessoas mais sábias do que eu, de alma mais forte e elevada, podem criar para si um repouso inteiramente espiritual.  Eu, que a tenho como todo mundo, preciso que as comodidades do corpo me ajudem.  E, tendo chegado à idade de perder as que mais me apeteciam, procuro as que me permite ainda esta época da vida, e arranjo-me para as aproveitar.  É preciso, por todos os meios possíveis, inclusive unhas e dentes se necessário, que conservemos o gozo das satisfações da vida que os anos nos arrancam aos poucos, umas após outras, das mãos: “gozemos; somente os dias que damos ao prazer são nossos; brevemente não serás mais que cinza, sombra, fábula.” [Persio]
                Plínio e Cícero sugerem-nos como objetivo a glória.  Não me interessa nem de longe. A disposição de espírito mais contrária à vida solitária está na ambição.  Glória e repouso são incompatíveis entre si.  Plínio e Cícero somente livraram o corpo da multidão; mais do que nunca a ela pelo espírito e a intenção: “velho pândego, então só trabalhas para divertir o povo?” [Persio]; recuaram para melhor saltar e mediante violento impulso caíram em cheio no rebanho.

                                               Montaigne
                                               Tradução de Sérgio Milliet