[“Porque os índios saíram das
florestas e passaram a descer nas áreas de produção.” Kátia Abreu, ministra da agricultura, em
entrevista à Folha de S. Paulo em 05 de janeiro de 2015, numa demonstração tenebrosa de ignorância histórica e insensibilidade]
Tupã, ó Deus grande! cobriste o teu rosto
E jazem teus filhos clamando vingança
Dos bens que lhes deste da perda infeliz!
Tupã, ó Deus
grande! teu rosto descobre:
Bastante
sofremos com tua vingança!Já lágrimas tristes choraram teus filhos,
Teus filhos que choram tão grande mudança.
Anhangá
impiedoso nos trouxe de longe
Os homens
que o raio manejam cruentos,Que vivem sem pátria, que vagam sem tino
Trás do ouro correndo, voraces, sedentos.
E a terra
em que pisam, e os campos e os rios
Que
assaltam são nossos; tu és nosso Deus:Por que lhes concede tão alta pujança,
Se os raios de morte, que vibram, são teus?
Tupã, ó
Deus grande! cobriste o teu rosto
Com denso
velâmen de penas gentis;E jazem teus filhos clamando vingança
Dos bens que lhes deste da perda infeliz.
Teus filhos
valentes, temidos na guerra,
No albor da
manhã quão fortes que os vi!A morte pousava nas plumas da frecha,
No gume da maça, no arco Tupi!
E hoje em
que apenas a enchente do rio
Cem vezes
hei visto crescer e baixar...Já restam bem poucos dos teus, qu’inda possam
Dos seus, que já dormem, os nossos levar.
Teus filhos
valentes causavam terror,
Teus filhos
enchiam as bordas do mar,As ondas coalhavam de estreitas igaras,
De frechas cobrindo os espaços do ar.
A corça ligeira, o trombudo coati...
A morte pousava nas plumas da frecha,
No gume da maça, no arco Tupi!
O Piaga nos
disse que breve seria
A que nos
infliges cruel punição;E os teus inda vagam por serras, pos vales,
Buscando um asilo por ínvio sertão!
Tupã, ó
Deus grande! descobre o teu rosto:
Bastante
sofremos com tua vingança!Já lágrimas tristes choraram teus filhos,
Teus filhos que choram tão grande tardança.
Descobre o
teu rosto, ressurjam os bravos
Que eu vi
combatendo no albor da manhã:Conheçam-te os feros, confessem vencidos
Que és grande e te vingas, qu’és Deus, ó Tupã!
In: Poemas de Gonçalves Dias. Ediouro, s/d.
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