terça-feira, 6 de janeiro de 2015

CAMINHADA PISANA




Era dia, torso e fibra
era uma visão despida
aquela que eu perseguia
sem guia imagem enigma
(A tarde toldava os becos
vivazes do sol de Pisa
de uma luz sem atropelo
de um sossego comedido
quase próximo da morte:
Muralha entrada e saída).
Por entre blocos de pedra
onde é ranhura é que medra
a palavra poliedra
espraiando-se, e ao fazê-lo
enreda motos e séculos
o que é ponte e é edifício
passo cálculo comércio
sacerdócio e turismo
numa fala multiplexa
moçárabe macarrônica
doce e no entanto toscana
mercantil e piedosa.
No largo das avenidas
caminho pro cemitério
como quem vai a passeio
- e eu vou mesmo a passeio
mas o falcão sobre a pomba
atira-se da cimalha
e célere a arrebata
ao pé da estátua do Dante
- em que círculo a colomba
foi se entregar gotejante
à volteada rapina
do bico de seu verdugo?
Pergunto e sigo a passeio
ao campo santo adiante
entre estreituras de becos
e epifanias de nesgas
o sol em fachadas sólidas
aqui e ali esboroando-se
como kebabs na lâmina
do solícito hindu
que me serve o mata-fome
e não me nega a cerveja.
Gatos e mais gatos sornas
me olham desentendidos
junto aos bares junto às torres
junto às muralhas, ruínas
onde Ugolino e seus filhos
recendendo em embutidos
sorvetes tripas e pizzas
reencarnam sua vermina.

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