quinta-feira, 6 de junho de 2024

SONETO DO GATO MORTO, de Vinícius de Moraes

 



SONETO DO GATO MORTO

                        Vinícius de Moraes

Um gato vivo é qualquer coisa linda
Nada existe com mais serenidade
Mesmo parado ele caminha ainda
As selvas sinuosas da saudade
 
De ter sido feroz. À sua vinda
Altas correntes de eletricidade
Rompem do ar as lâminas em cinza
Numa silenciosa tempestade.
 
Por isso ele está sempre a rir de cada
Um de nós, e a morrer perde o veludo
Fica torpe, ao avesso, opaco, torto
 
Acaba, é o antigato; porque nada
Nada parece mais com o fim de tudo
Que um gato morto.

 

Florença, novembro de 1963


MORAES, Vinícius de.  Obra reunida v. 1.  Org. Eucanaã Ferraz.  Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2017. 




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