SONETO DA CHUVA E DA VOZ
a
Miguel Sanchez Neto
Desde que
despertei está chovendo.
Aliás,
desde antes, pois, ainda dormindo,
claramente
escutei chuva caindolonge, por trás de um sonho: meu pai lendo,
para mim, Hora Absurda; ainda estou vendo
seu rosto
em luz antiga. Quase findoé o dia, agora, e a chuva caindo, caindo...
E em minha alma meu pai ainda está lendo.
Não é, como
no poema, um ouro baço
que chove
aqui: é só água do outonoque o calendário traz nos fins de março.
E a voz
prossegue. E, num sonho sem sono,
me consola
de mim nesse cansaço de outonos falsos, sombras, abandono.
In: Estação
infinita e outras estações (Poesia reunida). Bertrand Brasil, 2012.
Lindo, lindo, lindo.
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