RECITAL DA AUTORA
Musa, não
ser um boxeador é literalmente não existir.
Nos
recusaste a multidão ululante.Uma dúzia de pessoas na sala,
já é hora de começar a fala.
Metade veio porque está chovendo,
o resto é parente. Ó Musa.
As mulheres
adorariam desmaiar nesta noite outonal,
e vão, mas
só ao assistir uma luta colossal.Só lá as cenas dantescas.
E o ascenso aos céus. Ó Musa.
Não ser
boxeador, ser poeta,
estar
condenado a duras florbelas,por falta de musculatura mostrar ao mundo
a futura leitura escolar – na melhor das hipóteses –
Ó Musa. Ó Pégaso,
anjo eqüestre.
Na primeira
fila um velhinho sonha docemente
que a
finada esposa ressuscitou e assa para ele um bolo com passas.
Com fogo, mas não alto, para o bolo não queimar,
começamos a leitura. Ó Musa.
Tradução
de Regina Przybycien
Wislawa Szymborska.
Poemas. SP: Companhia das Letras, 2011.
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