ONDE ESTÃO?
Partimos cuando nacemos,
andamos mientras vivimos,y llegamos
al tiempo que fenecemos;
así que cuando morimos
descansamos.
Jorge
Manrique, Coplas por la muerte de su
padre, V
Onde estão
os que partiram
desta vida,
desvalidos?Onde estão, se não ouvimos
deles sequer uma sílaba?
Onde o pai, a mãe, a ríspida
irmã que se contorcia
sob a névoa dos soníferos
e a gosma da nicotina?
Ou bem a outra, a quem víamos
trincar, crispada, os caninos,
banhada em sangue e saliva,
no espasmo agudo das fibras?
Onde o riso
dos meninos
que entre
as folhas se escondiamcomo pássaros nos ninhos,
ermos de infâmia ou malícia?
Onde a
lúbrica menina
cujas coxas
se entreabriamà gula dos que sabiam
tocar-lhe os veios mais íntimos?
Onde,
enfim, toda a família
que se
desfez qual farinhapor entre as mós antiqüíssimas
de algum oculto moinho?
Onde estão
os que seguiram
seus
inóspitos caminhosou sendas que, mais propícias,
desaguaram no vazio?
Onde os bens, a glória, a insígnia,
se tudo o que aqui se vive
reverte empós aos jazigos
e lá, sob o pó, esfria?
Poder, riqueza, honraria
são como areia dos rios:
retinem, fluem, cintilam,
e se esvaem, sem valia.
Nômades de
ásperas trilhas,
andamos mientras vivimos,até que a morte, em surdina,
nos deite as garras de harpia.
E tudo
afinal se finda
sem cor,
sem luz, sem martírio;asi que cuando morimos,
de nós mesmos nos sentimos
tão
distantes quanto as cinzas
de uma
estrela que se extinguena goela azul dos abismos.
E ninguém, nem Deus, nos lastima.
Ivan Junqueira.
Poemas reunidos. RJ:
Record, 1999.
Ivan Junqueira (1934-2014) |
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