BREVE
DISCURSO EM DEFESA
DA INDECÊNCIA
nem no monástico silêncio dos cegos,
nem no escuro
sonoro dos surdoshá mundos tão mudos
ou palavras tão plenas
de nada
e vazias
de sentido
como na língua lânguida & engalanada
desses eruditozinhos
de beira de estrada
[com sua voz sisuda
e semi-tonada
pros nossos ouvidos-palatos
de alfa anal fabetos
ex-
pulsos
como flátulos
do paraíso
poético
apenas porque o nosso corpo é mais
proteico
do que o
nosso espíritoou seria porque o nosso falo famélico
fecunda mais fêmeas que a sua filistéica fala?
declaram que não sabemos
sânscrito nem lingala,nem grego antigo nem alemão, vociferam
que a métrica
é mais importante que
o nosso tesão e
o
dark, dark, dark. they all go into the dark.
até a joana darkaté o clark kent
até descartes
até a pop art é mais cult, oh my heart!
mas
um prepúcio vale mais que um precipício
um boquete vale mais do que um bouquet
mais valem duas vulvas voando que um verso na mão
uma suruba vale mais que mil palavras
e um poema, no mais das vezes
não vale nada
pois, senhores, o que gritamos é a vida
e não a regra; nem a que se escreve
nem a que se caga.
- as palavras, senhores
são águias rapinas
não trinos da moda;
e as rimas,
[mesmo as pobres, oh camões!
são ricas
quando cantadas com a ponta
da pica,
na cadência bonita da
foda.
In: Esculpir a luz. RJ: Cozinha Experimental, 2010.
DEUS
EX MACHINA
Boquinhas fechadas. Pálidas.
Dentro, a escavação. Os escombros.Porque a boca é o sótão do corpo.
E o que uma boca tem de mítico
tem de ridículo. Não cabe nenhuma boca
dentro de uma manga. Não há caroços
brancos nos dentes. Os dentes são
estalagmites e estalactites. A boca
é sempre cavernosa. Os dentes são morcegos.
A boca é notívaga. A boca parece um rato
com asas. Numa boca cabe
uma porção de terra.
O caixão é pequeno, é um caixão
de anões. Há muitas
bocas numa morte pequena.
Uma boca é uma grande cova
sem mistério. É onde se enterra
o silêncio. É onde se pesca o silêncio.
É onde o mau hálito, é onde
as obturações, é onde os vermes.
Dentro, a escavação. Há muita coisa
lá dentro, mas nenhuma imagem.
As boquinhas fechadas dormem
sem sonhar. Bocejos
são seres fantásticos e contagiosos,
mas o bruxismo gasta os caninos
de madrugada e os cisos doem
quando inflamam.
A boca é uma máquina ruim.
Poema inédito de Elefantes dentro
de um sussurro (no prelo)
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