telefonei assim que soube que ele havia sido solto. romilda sua mulher pediu-me que fosse até lá conversar com ele porque estava muito deprimido e
nervoso e eu como seu velho amigo talvez pudesse distraí-lo um pouco.
encontrei-o estirado no
sofá, o rosto magro, os olhos fundos cadavéricos. Abraçou-me beijou-me desesperadamente como se
eu fosse sua única saída mostrou as marcas de porrada que levou no dops no
corpo todo, falei q ele precisava descansar um pouco fazer uma viagem com a
mulher transar pessoas. mas ele me disse q não. q voltaria a ativa e q mataria
todos os “filhos da puta do poder”.
então tentei convence-lo de q o
desespero é uma forma de suicídio e q a
melhor arma neste momento é sentar & esperar. disse-lhe também q estávamos em vantagem porq
não acreditávamos em eternidade e q qualquer governo totalitário mais dia menos
dia se não fosse destruído pelas forças da história se destruiria a si mesmo.
então li meus poemas para
ele. contei das novas. falei dos amigos. dos meus planos. da minha mulher e da
minha filha. contei também das minhas angústias. Abrimos uma garrafa de
conhaque e quando menos esperávamos estávamos completamente bêbados. ele caiu
no sofá como uma criança desamparada. levantei-me. Despedi-me de romilda e saí
prometendo voltar no dia seguinte.
na rua fui tentando me
convencer de tudo o q havia dito ao meu amigo. tentando acreditar q era aquilo mesmo q eu
acreditava.
tive de repente uma imensa
pena de mim...
in: Folha de rosto (vários).
Rio, 1976.
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