quarta-feira, 12 de agosto de 2015

NERVAL


         Gérard de Nerval (1808-1855)

 

O PONTO NEGRO

 
Quem quer que tenha olhado o sol bem fixamente
Crê ante seus olhos ver, a voar teimosamente,
Ao redor, uma nódoa algo lívida, no ar.

Assim bem moço ainda e muito petulante
Ousei fixar na glória os olhos um instante:
Ficou-me um ponto negro em meu voraz olhar.

Depois, mesclado a tudo, em sinal de algum luto,
Por toda parte, onde o olho eu ponho ou mais perscruto,
Vejo-a também pospor-se assim, a negra escória!

Que coisa, sempre! Está entre mim e qualquer ventura!
Ó, é que apenas a águia – ai dessa desventura! –
Contempla impunemente os dois, o sol e a glória!

 

Tradução de Mauro Gama





 

LE POINT NOIR

 
Quiconque a regardé le soleil fixement
Croit voir devant ses yeux voler obstinément
Autour de lui, dans l'air, une tache livide.

Ainsi, tout jeune encore et plus audacieux,
Sur la gloire un instant j'osai fixer les yeux :
Un point noir est resté dans mon regard avide.

Depuis, mêlée à tout comme un signe de deuil,
Partout, sur quelque endroit que s'arrête mon oeil,
Je la vois se poser aussi, la tache noire !

Quoi, toujours ? Entre moi sans cesse et le bonheur !
Oh ! c'est que l'aigle seul - malheur à nous, malheur !
Contemple impunément le Soleil et la Gloire

 

         Gérard de Nerval.  Cinquenta poemas.  Tradução de Mauro Gama. Cotia, SP: Ateliê, 2013.

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