Avenida São João, centro de São Paulo, nos anos 20 |
COCKTAIL
HOTEL RESTAURANT BAR
A cadeira guincha
Garçon
No espelho “Experimente nosso COCKTAIL”
Champagne
cocktail
Gin
cocktail
Whisky
cocktail
Álcool
Absinto
Açúcar
Aromáticos
Sacode num tubo de metal
É frio estimulante e forte
Cocktail
Cocteau
Cendrars
Rimbaud cabaretier
Espontaneidade
Simultaneísmo
O só plano intelectual traz confusão
Associação
Rapidez
Alegria
Poema
Arte moderna
COCKTAIL PARA UM!
Não; para todos
Vinde encher o copo do coração com o
meu cocktail sentimental
Sentimental?!
In: Luís
Aranha. Cocktails. Brasiliense,
1984.
Devemos sobretudo ao poeta Nelson Ascher o fato de a obra
poética de Luís Aranha (1901-1987) não
ter caído em total esquecimento. O poeta
ainda era vivo quando Ascher tomou a si a iniciativa de editar, pela
Brasiliense, em 1984, Cocktails,
coletânea de poemas escritos nos anos 20, que haviam sido entregues por Aranha
a Mário de Andrade nos anos 20, e que desde
então, à exceção de quatro poemas publicados na revista modernista Klaxon, permaneciam inéditos.
Aranha, muito jovem, era um poeta inquieto, ativo participante das
discussões e iniciativas modernistas em torno da Semana de 22. Depois foi se afastando da atividade
literária, mas deixou em Cocktails,
no meu entendimento, o melhor da apreensão por parte dos nossos modernistas de
primeira hora da poética futurista-cubista (Marinetti, Appolinire, Cendrars)
que agitava a Europa desde os anos de 1910.
Embora os três longos poemas de Cocktails , “Drogaria de éter e de sombra”, “Poema Pitágoras” e “Poema
giratório”, sejam de fato, Ascher o diz com acerto, o melhor de Luís Aranha,
pela proximidade com o espírito estrepitosamente urbano dos longos poemas
futuristas de, por exemplo, Appolinaire,
Álvaro de Campos e Cendrars, nos quais
avultam as questões da velocidade e do simultaneísmo mais do que apenas como temas
mas com o valor de princípio estrutural, como diz Marjorie Perloff (em O momento futurista, editado entre nós
pela EdUsp em 1993), espraiados por textos de larga extensão nos quais a “imaginação
sem fios” solta-se, como então preconizavam
os postulados vanguardistas, num poema como “Cocktail” tais questões também
comparecem – mesmo numa clave metalingüística, ainda que ingênua e sem que
venha a estender-se por muitos versos. Observe
o leitor que a presentificação dos elementos da vida cotidiana, da vida externa à arte, se faz no poema à semelhança de um procedimento de colagem de materiais que, na
pintura cubista, eram literalmente colados à tela: assim como um guardanapo era colado numa tela
de Braque ou do Picasso cubista, no poema temos o letreiro de entrada “HOTEL
RESTAURANT BAR” indicados como portada
para o “ambiente” em que se desenvolve o misto de auto-reflexão paródica e
etílica do poeta – antecipando, se é lícito dizer, aquele cognac que comoverá o Drummond no “Poema de sete faces” alguns anos
depois. Exemplo melhor ainda seria a tabuleta de drogaria que abre o “Drogaria
de éter e de sombra”, mas o poema, por sua extensão, é impraticável de ser aqui
postado.
Espero que o leitor que porventura ainda não tenha conhecimento da
pequena mas significativa obra poética de Luís Aranha procure ler este poeta, sua
obra atua como um poderoso reforço à compreensão do primeiro Modernismo entre
nós e de seus laços com a poética vanguardista de então.
Os modernistas da fase heróica: sentado, na poltrona ao centro, Luís Aranha, logo atrás de Oswald (no chão) |
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