DO MECENATO
De manhã ,
alguém
Deixa sobre
o chãoDa jaula, ainda suja
De excremento e sonhos,
O prato de ração.
Nesse instante, ele pensa
(Breve espaço sem grades)
Um mundo mais justo,
Onde o pão não custe
Essa cabeça baixa,
Esse rubor ao insulto,
Esse olhar melancólico
A todas as escadas.
De dia, ele corre
O picadeiro com
A juba irritada
E urra como bicho
E vocifera, mas
Um chicote o traz
De volta à realidade.
Então, submisso,
Ele rola a bola,
Ele pula o arco,
Ele sob o degrau
Sob o olhar ferino
Da culta platéia,
Que no riso se vinga
Desse leão frustrado
Que há em todos nós.
De noite, ele volta
À rua de sempre,
À lua de sempre,
Ao sono de sempre
Sob cobertores
E dorme, no consolo
De que, neste mundo,
Apesar de tudo
Há sempre mais leões
Do que domadores.
José
Paulo Paes. Poesia completa. SP:
Companhia das Letras, 2008.
Nenhum comentário:
Postar um comentário