sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

FIRMA IRRECONHECÍVEL, SEGMENTOS 9 E 10 (FINAL)






No dia 12 de abril postei o primeiro segmento dos dez em que foram divididos o poema “Firma irreconhecível”, dos quais oito já postei aqui, a cada 1 mês aproximadamente de intervalo.  Como eu expliquei no 1º. segmento, este poema dá título ao meu segundo livro, lançado em 2009.  Como ele ocupa sozinho 45 das 170 páginas do livro, resolvi lançá-lo em CD, só o poema, o qual, para comodidade de quem queira ouvir, foi dividido meio que aleatoriamente em 10 faixas. Para fechar o ano e porque também esses dois segmentos finais na verdade são apenas uma sequência única na “lógica” do texto, posto aqui os dois de uma vez.  Ao final do texto, remeto o possível interessado aos links das postagens dos segmentos anteriores.

Dá ganas de assinar tudo
onde sobra assinatura,
onde falta assinatura incide
um tempo incerto, sem
medida e  sem moldura,
agora que a porca espera
só o rabo ser torcido
pra dar cabo duma vez
do que foi mal-entendido,
do que não passou de aceno
a fugir do esquecimento
do que ficou obscuro
do gato e do jumento,
assim como do cavalo,
cavalgadura monumen-
to, complemento adjun-
to cavilar cavalgamento,
o anum, o assum, o corvo,
o corvo, o assum, o anum,
o cavalo e o jumento,
tantos todos caracóis,
todos esses bichos juntos
e mais seus específicos
vertebrais prolongamen-
tos, forma imperfeita
neste mundo de aparências,
escorpião encalacrado
em seus próprios ferimentos,
secreção de baço podre,
alma em que a sífilis deu,
phylogenética vingança
quando não se diz mais:
Meu Deus, livrai-me do mundo
das formas, do inferno me
livro eu, desta vez acabo
a obra e quem dá cabo
sou eu, se a obra não se a-
caba desta vez  me acabo
eu, e o que dá cabo da obra
se não der  sobra a sobra,
da cobra o rabo de fora
não cabe onde cabo deu,
e o cobro que a obra cobra
não cabe no cabo da obra,
não acaba o cabo a obra
que o rabo da cobra sobra,
e na sobra da obra o cabo
não cabe e nem caibo eu.
Em tudo que no céu viaja
vida toda linguagem
viaja uma invenção de
Orfeu Orftu Orfele Orfnós
Orfvós Orfeles,  pela
estrada da dissonância
viaja a doce imagem delas,
como são lindas as mulheres!,
riso franco de varandas,
quero perpetuá-las,
só todas de algumas delas,
nelas quero perdurar,
tola tenção de iluso
narciso intruso porfia,
a mulher que foi comigo,
a que não foi mas iria, a
que a vontade de viciado
satisfazer saberia, a
que sente meus dedos frios
sobre a sua espádua nua,
a que só me saberá
quando eu feder à sua porta,
a mulher vesga do gerente
com um belo par de pernas,
a que me proveja de vinho,
legume, fruta, azeite,
a de quem furtei o peito
que dava leite para a filha,
a de quem ouço o mugido,
ganga informe sem palavra
ou melodia, canto inter-
rompido pela língua
paralítica, a que ajoelha
e mente aos pés da santa
cruz, perjura, a quem da in-
fância me perdeu no mangue
de carne escura, aquele amor,
nem me fale, dlendlena e es-
guicha luz como se a noite
mudara no mais cris-
talino dia, no meio da
tempestade, je les veux
perpétuer, velozes por
entre os ramos, nuas
por entre o mato, negan-
do à mão aos olhos dando,
ninfas a me bouleverser,
dez entre nove, o nome,
quero ver dizer o nome
o nome de quatro meninas
Analice, Doralice,
Marilice, Rosalina,
o nome de oito meninas,
Ivonete, Luzinete,
Internete, Gonçalina,
Analice, Doralice,
Marilice, Rosalina,
quero ver dizer o nome
o nome de vinte meninas,
Glaucileide, Gladislene,
Aparecida, Hermolina,
Luzinéia, Januária,
Saradiva, Carolina,
Cleonice, Laodicéia,
Daniela, Sacarina,
Ivonete, Luzinete,
Internete, Gonçalina,
Analice, Doralice,
Marilice, Rosalina,
disse vinte vinte e uma
com a mais nova das meninas
Mariana três vez sete
vinte vítimas mais uma
apague os nomes seu poeta
tranque o estro, venda o engenho,
corte o sestro, cumpra a sina,
morra cedo, dê seu jeito,
troque o truque, faça o fácil
do ofício, puxe do fácil
o difícil, do difícil tire
o fácil,  do inócuo tire o
iníquo, papéis velhos para
a pira, certidões, álbuns
de moça, retratos, ilum-
inuras, carretéis mal-
baratados, santelmos
na noite escura, não se perca
na minúcia, alegria é a
vizinha mais antiga da
tristura, labirinto da sau-
dade, lábios de outra idade,
sábios dormem a cidade,
verdade é o mesmo que mentira,
o mesmo que ficção,
fiação, tesoura e lira, 
vocêelaeu desfeito,
idêntica identifica
tudo assim do mesmo jeito
onde quer que esteja agora,
em Marte ou Eldorado,
chego onde em sono ela mora
a encontrar do outro lado
do lado de lá da aurora
no magma, no Japão, na água, 
oceano de acenos
impercebidos do porto,
meu espelho face a face
onde a dor entranha a ostra
que o mergulhador desventra
sedento de outra boca
agra flor de amarugem
sem sombra,  traço, linha
ou ponto, sem nojo, nódoa ou
tonsura, quero ver, quero
que mostre o indene ao
sedimento e ao bolor
que se acumula, anti-
nosto, coruscante feixe
posto ante o sol-posto,
aos fractais da lonjura,
quero o incorrupto exposto,
o que deflagra, o que ulula,
o que não se dissemina,
não dissipa, não considera
retorno, o que propõe,
o que dispõe, o que firma
da assinatura o oposto, quero,
mostra-me teu rosto.

3 comentários:

  1. Brilhante!
    Gostei mesmo.

    Depois disso precisou de ajuda de aparelhos pra respirar, né?!

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  2. Caio,

    obrigado. Foi mais ou menos isso mesmo, só que não depois de gravá-lo, mas de ter escrito o poema, num processo que incluía escrita e voz e que durou 4 meses.

    abraços
    do bozzetti

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