NÃO MAIS
Preciso
contar um dia como mudei
Minha
opinião sobre a poesia e por queMe considero hoje um dos muitos
Mercadores e artesãos do Império do Japão
Compondo versos sobre a floração da cerejeira,
Sobre crisântemos e a lua cheia.
Se eu pudesse descrever as cortesãs
De Veneza, como incitam com uma vareta o pavão no pátio
E desfolhar do tecido sedoso, da cinta nacarina
Os seios pesados, a marca
Avermelhada no ventre onde o vestido se abotoa,
Ao menos assim como as viu o dono das galeotas
Arribadas aquela manhã carregando ouro;
E se ao mesmo tempo pudesse encerrar seus pobres ossos
No cemitério, onde o mar oleoso lambe o portão,
Em palavras mais duráveis que o derradeiro pente
Que entre carcomas sob a lápide, só, espera pela luz
Não duvidaria. Da resistência da matéria
O que se retém? Nada, quando muito o belo.
Então devem nos bastar as flores de cerejeira
E os crisântemos e a lua cheia.
Montgeron, 1957
Tradução de
Henryk Siewirski e Marcelo Paiva de Souza
Czeslaw Milosz. Não
mais. Sel. trad. e introd. de Henryk
Siewirski e Marcelo Paiva de Souza. Coleção Poetas do Mundo. UnB. 2003.
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