sábado, 14 de setembro de 2013

ADÉLIA PRADO


O LUGAR DA NECRÓPOLE

 

Há quem tendo cantado e batido os dentes no copo já morreu.
Há quem tendo falado suas dores secretas
está hoje selado sob lápides,
excrescendo sobre mim o seu fantasma
de pessoa verdadeira, rebelada,
de pessoa poética.
Na juventude me comprazia o fúnebre,
as faces lívidas dos poetas doentes.
Hoje, só preciso da vida para morrer.
Nas metrópoles,
o campo-santo acaba confundido,
rodeado de bares.
E por causa disso iludem-se as pessoas
de ter na mão a indomesticável.
O cemitério quer ladeira e montes
para os quais se olha ao entardecer:
um dia estarei lá,
                        lá longe,
no incontestável lugar.

 

Adélia Prado. Terra de Santa Cruz.  RJ: Nova Fronteira, 1981.


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