domingo, 28 de abril de 2013

HART CRANE E VINÍCIUS DE MORAES


MEDUSA

“Caia comigo
Nas estrelas frígidas
Caia comigo
Na luz do delírio
Mergulhe
Onde não há canção
Salvo as cãs dos ventos velhos.

Siga-me
Até o fim,
Até o caos estonteante
O eterno caos fervente
Dos meus cabelos!

Contemple a sua amante, −
Pedra!”

            Tradução de Augusto de Campos

Ilustração de Talarico


  
MEDUSA

“Fall with me
Through the frigid stars:
Faal with me
Through the raving light:
Sink
Where is no song
But only the white hair of aged winds.

Follow
Into utterness,
Into dizzying chaos,
The eternal boiling chaos
Of my locks!

Behold thy lover,
Stone!”

Augusto de Campos. Poesia da recusa. Perspectiva, 2006. 


            Hart Crane nasceu em 1899 em Ohio.  Em 1932 atira-se de um navio na costa americana, quando voltava de uma viagem ao México, dando fim a uma vida marcada por conflitos com a sua homossexualidade e pelo alcoolismo.  Em 1953, Vinícius de Moraes dedica-lhe o belo poema a seguir:


O POETA HART CRANE SUICIDA-SE NO MAR

Quando mergulhaste na água
Não sentiste como é fria
Como é fria assim na noite
Como é fria, como é fria?
E ao teu medo que por certo
Te acordou da nostalgia
(Essa incrível nostalgia
Dos que vivem no deserto...)
Que te disse a Poesia?


Que te disse a Poesia
Quando Vênus que luzia
No céu tão perto (tão longe
Da tua melancolia...)
Brilhou na tua agonia
De moribundo desperto?

Que te disse a Poesia
Sobre o líquido deserto
Ante o mar boquiaberto
Incerto se te engolia
Ou ao navio a rumo certo
Que na noite se escondia?

Temeste a morte, poeta?
Temeste a escarpa sombria
Que sob a tua agonia
Descia sem rumo certo?
Como sentiste o deserto
O deserto absoluto
O oceano absoluto
Imenso, sozinho, aberto?

Que te falou o Universo
O infinito a descoberto?
Que te disse o amor incerto
Das ondas na ventania?
Que frouxos de zombaria
Não ouviste, ainda desperto
Às estrelas que por certo
Cochichavam luz macia?

Sentiste angústia, poeta
Ou um espasmo de alegria
Ao sentires que bulia
Um peixe nadando perto?
A tua carne não fremia
À idéia da dança inerte
Que teu corpo dançaria
No pélago submerso?

Dançaste muito, poeta
Entre os véus da água sombria
Coberto pela redoma
Da grande noite vazia?
Que coisas viste, poeta?

De que segredos soubeste
Suspenso na crista agreste
Do imenso abismo sem meta?

Dançaste muito, poeta?
Que te disse a Poesia?

Vinícius de Moraes. Poesia completa e prosa. 1987.







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