domingo, 16 de agosto de 2015

INTIMAÇÃO

                                                 

Cidadãos franceses assistem à entrada de Hitler na Marcha sobre Paris, 1940 (autor desconhecido)
 


                                Carlos Drummond de Andrade (1902-1987)

 

Abre em nome da lei.
Em nome de que lei?
Acaso lei tem nome?
Em nome de que nome
cujo agora me some
se em sonho o soletrei?
Abre em nome do rei.

Em nome de que rei
é a porta arrombada
para entrar o aguazil
que na destra um papel
sinistramente branco
traz, e ao ombro o fuzil?
 
Abre em nome de til.
Abre em nome de abrir,
em nome de poderes        
cujo vago pseudônimo
não é de conferir:
cifra oblíqua na bula
ou dobra na cogula
de inexistente frei.

Abre em nome da lei.
Abre sem nome e lei.
Abre mesmo sem rei.
Abre, sozinho ou grei.
Não, não abras: à força
de intimar-te, repara:
eu já te desventrei.

 

 

Carlos Drummond de Andrade. Poesia e prosa. RJ: Nova Aguilar, 1983.



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