Jorge Luís Borges (1899-1986)
AS RUAS
AS RUAS
As
ruas de Buenos Aires
já
são minhas entranhas.Não as ávidas ruas,
incômodas de gente e bulício,
mas as ruas indolentes do bairro,
quase invisíveis de tão usuais,
enternecidas de penumbra e de ocaso
e aquelas mais ao longe
carentes de árvores piedosas
onde austeras casinhas apenas se aventuram,
abrumadas por imortais distâncias,
a perder-se na profunda visão
de céu e de lhanura.
São para o solitário uma promessa
porque milhares de almas singulares as povoam,
únicas perante Deus e no tempo
e sem dúvidas preciosas.
a Oeste, ao Norte, e ao Sul
desdobraram-se — e também são a pátria — as ruas;
tomara que nos versos que traço
estejam essas bandeiras.
LAS
CALLES
Las calles de Buenos Aires
ya son mi entraña.No las ávidas calles,
incómodas de turba y ajetreo,
sino las calles desganadas del barrio,
casi invisibles de habituales,
enternecidas de penumbra y de ocaso
y aquellas más afuera
ajenas de árboles piadosos
donde austeras casitas apenas se aventuran,
abrumadas por inmortales distancias,
a perderse en la honda visión
de cielo y llanura.
Son para el solitario una promesa
porque millares de almas singulares las pueblan,
únicas ante Dios y en el tiempo
y sin duda preciosas.
Hacia el Oeste, el Norte y el Sur
se han desplegado -y son también la patria- las calles;
ojalá en los versos que trazo
estén esas banderas.
Jorge Luis Borges. In: Primeira Poesia; tradução de Josely Vianna Baptista. SP: Companhia
das Letras, 2007.
O jovem Borges, c. 1920, época da publicação do poema |