quarta-feira, 22 de julho de 2015

OLIVERIO GIRONDO

                                                                             Oliverio Girondo (1891-1967)



QUE OS RUÍDOS TE PERFUREM OS DENTES

Que os ruídos te perfurem os dentes,
como uma broca de dentista,
e a memória te encha de ferrugem,
de odores descompostos e de palavras rotas.
Que cresça em cada um dos teus poros,
uma pata de aranha;
que só possas alimentar-te de baralhos usados
e que o sonho te reduza, como uma plaina,
à espessura de teu retrato.
Que ao sair à rua,
até os faróis te botem pra correr;
que um fanatismo irresistível te obrigue a ajoelhar
em frente às latas de lixo
e que todos os habitantes da cidade
te confundam com um poste.
Que quando queiras dizer: “Meu amor”,
digas: “Peixe frito”;
que tuas mãos tentem estrangular-te a cada instante,
e em vez de jogar fora o cigarro,
sejas tu que te atires nas escarradeiras.
Que tua mulher te traia até com bujões.
que ao deitar-se junto a ti,
se metarmofoseie em sanguessuga,
e que depois de parir um corvo,
ilumine uma chave inglesa.
Que tua família se divirta em deformar teu esqueleto,
para que os espelhos, ao te olharem,
suicidem de repugnância;
que teu único entretenimento consista em ficar
na sala de espera dos dentistas,
disfarçado de crocodilo,
e que te apaixones, tão loucamente,
por uma caixa de ferro,
que não possas deixar, nem por um instante,
de lamber-lhe a fechadura.

                                           Olivério Girondo, tradução de Fred Girauta.
 
 
Ilustração de Talarico
 
 
 
Que los ruidos te perforen los dientes,
como una lima de dentista,
y la memoria se te llene de herrumbre,
de olores descompuestos y de palabras rotas.
Que te crezca, en cada uno de los poros,
una pata de araña;
que sólo puedas alimentarte de barajas usadas
y que el sueño te reduzca, como una aplanadora,
al espesor de tu retrato.
Que al salir a la calle,
hasta los faroles te corran a patadas;
que un fanatismo irresistible te obligue a posternarte
ante los tachos de basura
y que todos los habitantes de la ciudad
te confundan con un madero.
Que cuando quieras decir: “Mi amor”,
digas: “Pescado frito”;
que tus manos intenten estrangularte a cada rato,
y que en vez de tirar el cigarrillo,
seas tú el que te arrojes en las salivaderas.
Que tu mujer te engañe hasta con los buzones;
que al acostarse junto a ti,
se metamorfosee en sanguijuela,
y que después de parir un cuervo,
alumbre una llave inglesa.
Que tu familia se divierta en deformarte el esqueleto,
para que los espejos, al mirarte, s
e suiciden de repugnancia;
que tu único entretenimiento
consista en instalarte en la sala de espera
de los dentistas, disfrazado de cocodrilo,
y que te enamores, tan locamente,
de una caja de hierro,
que no puedas dejar, ni por un solo instante,
de lamerle la cerradura.
                                                   Oliverio Girondo. Obra. Editorial Losada. Buenos Aires. 1968

 

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