ODE 343
Não a
Ti, Cristo, odeio ou menos prezo
Que
aos outros deuses que te precederam
Na memória dos homens.
Nem
mais nem menos és, mas outro deus.
No
Panteão faltavas. Pois que vieste,
No
Panteão o teu lugar ocupa,
Mas cuida não procures
Usurpar
o que aos outros é devido.
Teu
vulto triste e comovido sobre
A
'steril dor da humanidade antiga
Sim,
nova pulcritude
Trouxe
ao antigo Panteão incerto.
Mas
que os teus crentes te não ergam sobre
Outros,
antigos deuses que dataram
Por
filhos de Saturno
De
mais perto da origem igual das coisas.
E
melhores memórias recolheram
Do
primitivo caos e da Noite
Onde
os deuses não são
Mais
que as estrelas súbditas do Fado.
Tu não
és mais que um deus a mais no eterno
Não a
ti, mas aos teus, odeio, Cristo.
Panteão
que preside
À
nossa vida incerta.
Nem
maior nem menor que os novos deuses,
Tua
sombria forma dolorida
Trouxe
algo que faltava
Ao
número dos divos.
Por
isso reina a par de outros no Olimpo,
Ou
pela triste terra se quiseres
Vai
enxugar o pranto
Dos
humanos que sofrem.
Não
venham, porém, 'stultos teus cultores
Em teu
nome vedar o eterno culto
Das
presenças maiores
Ou
parceiras da tua.
A
esses, sim, do âmago eu odeio
Do
crente peito, e a esses eu não sigo,
Supersticiosos
leigos
Na
ciência dos deuses.
Ah,
aumentai, não combatendo nunca.
Enriquecei
o Olimpo, aos deuses dando
Cada
vez maior força
P'lo
número maior.
Basta
os males que o Fado as Parcas fez
Por
seu intuito natural fazerem
Nós
homens nos façamos
Unidos
pelos deuses.
Fernando Pessoa. Obra poética. Rio: Aguilar, 1965.
Nenhum comentário:
Postar um comentário