quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

ZUCA SARDAN: ALGUNS POEMAS


Auto-retrato de Zuca Sardan



E sobretudo, meu caro leitor,
Não me faça perguntas difíceis...


INVOCAÇÃO
Prestai-me vossas oiças,
Oh Grandes Monarcas,
Presidentes da República,
E outros Chefes Supremos
Que ditais os destinos da Humanidade
da magnificência de vossos palácios
e de vossos austeros gabinetes...

Napoleão, quando tinha
que saldar diferenças,
algum tira-teima mais brabo,
alguma pinimba com o Rei da Prússia,
ou com o Tsar das Rússias, por exemplo,
Napoleão
vestia o chapéu de três bicos
montava no cavalinho branco
E lá ia ele
pacacá, pacacá
à frente da turma,
pra dentro da fumaceira,
pra dentro do rolo,
do fura-bucho,
do arranca-toco,
e do pega-pra-capar...




INSTABILIDADE METEOROLÓGICA

O Sol, relendo Machado, do bolso
puxa uma nuvem, e funga
tristonho, me dizendo:
“Quem me dera que eu fosse
um simples vagalume!...”

Filósofo sem guardachuva
que não sou Quirquegarde,
fui logo obtemperando:
“Ora essa, largue de bobagem...”




DIALÉTICA SOCRÁTICA

- Platão é uma cabeça mais alto que Filolau;
e Filolau é uma cabeça mais baixo que Platão.
Logo Platão é duas cabeças mais alto que Filolau.
- Como assim, Sócrates? Acho que você está exagerando...
- Vejamos então... Platão não é mais alto que Filolau?
- Estou persuadido, Sócrates, que Platão é mais alto.
- Então você diria que Platão é alto e Filolau baixinho?
- Não há dúvida, Platão é bem alto.
- E Jasão não é mais alto que Platão?
- Certamente, Platão lhe bate pelo peito...
- Então você diria que Jasão é altão e Platão baixinho?
- Creio que sim. Platão é meio baixote.
- Como pode você dizer que Platão é bem alto
e meio baixote?
- Ora, Sócrates, você precisa ver que o Filolau
está sentado...




ZUM E A METAFÍSICA

“Porque ó Venerável, existe o mal?”
indaga o ressentido Bacamarte.

“Eu é que sei?” brada Malaquias,
“Porque não é o mundo
em forma de livro,
com ilustrações sem sépia,
ou hachurado grosso,
ou escrito em papel de arroz?
Enfim, vamos parar
com perguntas tolas
e vá me buscar uma cerveja”. 




MAL COMPARANDO

Se poesia fosse táxi
já arrancava
com o leitor pagando
bandeira dois.



           
ENIGMA EGYPCIO

“Decifra-me
ou te devoro...”

“Mas devagarzinho...
Bem devagarzinho...”

            (in: Osso do coração. Ed. Unicamp, 1993)
           
            Zuca Sardan é um poeta carioca, nascido em 1933, singularíssimo, único na poesia brasileira.  O leitor interessado pode iniciar-se em seu universo lendo sua entrevista à revista eletrônica Trópico, disponível em http://pphp.uol.com.br/tropico/html/textos/2528,1.shl



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