sábado, 29 de janeiro de 2011

FLORENÇA



           “Ah, você esteve em Florença? E o que achou do lampredotto?” “Ah, adorei! Tudo lá é magnífico! Giotto, Leonardo, Michelangelo, Botticelli, Lampredotto, adorei tudo, cada um melhor que o outro!” Claro que ele não tinha a menor idéia do que eu tinha perguntado, claro que ele tinha estado em Florença por três dias e... não tinha conhecido o lampredotto.  Eu nunca fui a Florença.  Não sei se chegarei a ir. Em compensação, se eu puder ficar por lá só uns dois ou três dias nem vou – se tiver de ir mesmo assim, só vou querer saber do lampredotto.
Edmundo, o Animal, jogou na Fiorentina uma temporada inteira.  Voltou inadaptado, todo mundo sabe, reclamando da cidade: “Só tem velharia”.    Se eu puder ir pra ficar morando lá por uns seis meses, eu topo.  Existe o tal “mal (ou febre ou estresse) fiorentino”, que se resume ao seguinte: por ser Florença o que é, quem visita  a cidade com pouco tempo disponível acaba sofrendo de uma ansiedade cultural  que atinge as raias do patológico: sabendo que não terão como dar conta nem de 1% do enorme acervo artístico espalhado não só por museus e galerias, mas também presente em cada calçada e cada “palazzo” , as pessoas simplesmente adoecem e em alguns casos com relativa gravidade. É uma patologia conhecida na cidade e acomete muita gente. Tenho pra mim que menos de seis meses em Florença é tolice.  Então, numa visita rápida eu vou mesmo é querer conhecer – e muito! – o lampredotto.
Vi num programa de TV há alguns anos (lembro uma frase deliciosamente esnobe do Bosi: “a TV é o paraíso do viajante de poltrona”): o lampredotto é a típica comida de rua de Florença e consiste num sanduíche de... tripa! bucho, sanduíche de bucho de boi, isso mesmo. Vi fazer (que é como eu aprendo a cozinhar pra valer): mergulha-se um bom pedação de bucho de boi num caldo de água fervente bem aromatizado (só de pensar nas ervas toscanas, hum...) e depois de bem cozido, quando o freguês pede, o “trippaio” vai, corta em fatias o correspondente a uma porção para um sanduíche, tempera com anchova salgada (que a gente aqui só usa pra fazer “pizza de alíti”, argh!), azeitonas, pimentas e pimentões, alcaparras, enfim... uma festa! Dispõe tudo isso num pão que se abre na hora e... um belo copo de vinho tinto (em geral, Chianti) pra ajudar a digestão.
Ouvi falar, ou li não sei onde, que com as leis contra as precárias condições de higiene das comidas de rua somadas àquelas que proíbem um pentelhésimo de teor alcoólico em qualquer organismo vivo, o lampredotto estaria ameaçado de extinção, por essa praga das leis estreitas que se espalha pelo mundo.  Daqui do meu brejo estarei atento: qualquer ameaça mais séria ao lampredotto engrossarei as barricadas apocalípticas do vandalismo puro e simples e, invocando Marinetti, ajudarei a destruição da cidade-museu, de modo a que Michelangelo, Dante, Maquiavel, Giotto, lampredotto, tutti quanti, e mais o Animal, passem a ser tão somente, como diria o Chico, “vestígios de estranha civilização.”




6 comentários:

  1. Porra que fome! Rs
    Isto deve ser uma maravilha. Adoro misturadas "loucas", lembro do churrasquinho de frigideira que meu pai me ensinou a preparar! Picadinho de carne com pimentão, cebola, alho, tomate e na minha mistura mais evoluida e cega de fome(lari), rs, chego a colocar tudo que tenho direito, molho ohio, oregano, champion, cheiro verde, etc. É bem peculiar, mas gosto muito! O macarrão com molho branco também sofre com essas minhas misturadas! kkkkkk
    Aquele abraço!

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  2. Kassio,

    obrigado pelo comentário.

    Grande abraço
    do Bozzetti

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  3. ah... pois é, em florença por 5 dias, rodei a cidade cima a baixo, ruas, vielas, parques extra-turísticos, mercados, pães e chiantis para levar ao albergo, davis de todos os tamanhos... tivesse lido isso antes, hummmm? e olha que nem sou da carne, que dirá das tripas, coração...
    adoro teu blog
    beijo

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  4. Ed é um mesmo um "filósofo"! Só há mesmo velharias! rs. Mas...essa misturada de tripa, não sei, não. Acho que...acho que...a "tripinha de Davi" me parece, digamos, menos indigesta, kkk.

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  5. Obrigado pelo carinho, "incógnita". Que bom que você adore o Firma, fico feliz.

    Jmelo, será a tripinha de Davi também uma velharia, pelos padrões do "filósofo"!

    Obrigado, dois abraços
    do Roberto Bozzetti

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  6. Hum...pelo "conjunto da obra" que é O DAVI, acho que até mesmo o Ed (se chegado fosse, rs) daria "tratos à(s) bola(s)", e à tripinha, rsrsrsrs. Quanta bobagem! rs

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